terça-feira, 31 de março de 2015

Do outro lado da beleza


Ninguém  conhece os nomes, nem as mãos, nem o trabalho que fazem todos os dias... Sem elas, a Beleza não estaria completa.

Abrir o trabalho...
Uma homenagem às mulheres que lavam, que abrem, que recortam, que engomam...
Em nome de todas, a D. Rita e a D. Encarnação ainda repetem os gestos que fazem do Bordado o que ele [ainda] é:
 
 limpar...
Engomar...




A arte





quarta-feira, 25 de março de 2015

HERBERTO HELDER de Oliveira

A morte está agora diante de mim
como o fim da chuva
como o regresso de um homem
que um dia partiu para além-mar.
(HELDER, 1996:213)

De procuras. De uma longa procura do coração da ilha. De conquistas. De uma longa conquista do mundo que mora para além das paredes basálticas que lhe serviram de berço. De universo. De uma constante busca do universo que se guarda dentro do poema: ligando a noite ao dia, o oculto ao revelado, o pressentimento ao acontecimento, / - tudo no mundo, na história. / A poesia propõe a história no mundo (HELDER, 1977:15).

Nascido na Madeira, em 1930, cedo se afastou da ilha e foi à procura de vestígios de uma arquitetura oculta do universo. Procurou(-se) certamente pelos mundos que o mundo lhe abriu. e encontrou-se Poeta, tantas vezes possuído pela força animista da linguagem, porque as regras de organização do poema são as mesmas da natureza (HELDER, 1977:9) e essa ele conhecia bem.

A escrita tornou-se um exercício de montagem, de criação da ordem, do significado, da instauração de uma unidade cósmica, de si, talvez. O centro: o poema revitaliza a vida ( HELDER, 1977:10).
Então, sim, a epifania. Ou o apocalipse: Vou morrer /O ouro está perto. (HELDER, 1977:27).

Morreu o homem. Não o poeta. Talvez tenha encontrado o ouro. Talvez o ouro o tenha encontrado. Talvez tenha perdoado. e regressado.

A morte está agora diante de mim
como o instante em que o céu se torne puro,
como o desejo de um homem de rever a pátria
depois de longos, longos anos de cativeiro.
(HELDER, 1996:213)
 
HELDER, Herberto, Cobra & Etc, Lisboa, 1977
HELDER, Herberto, Poesia Toda, Lisboa, 1996
 

segunda-feira, 23 de março de 2015

Uma homenagem


Bordadeiras

 


 
 

Sentam-se á porta mal desponta o dia,
- em ao lado o cestinho de costura-
Cercadas de maciços de verdura
Aonde canta  alegre cotovia.
 
E n’esta doce paz, n'esta harmonia,
Beijadas pela aragem suave e pura,
N’uma cambraia da maior alvura,
-Tanta que a propria neve a invejaria ;-
 
Bordam um enxoval  para noivado ;
Mas que lindo que elle é! que bem bordado!
Nunca se viu uma  belleza assim;
 
Tão fresco ! todo a flôr de laranjeira!
E suspiram uma e outra bordadeira :
-Ah! se tudo isto fôsse para mim !
 
 RODRIGUES, António Feliciano (Castilho), Sonetos, Lisboa , 1916, p. 51.

terça-feira, 17 de março de 2015

Newsletter 26: Bordados da Madeira [uma história de vida(s)]

Há lugares onde o tempo se demora. Há lugares onde a História se borda, porque a História da Madeira é [também] uma História de se bordar. Há lugares assim: feitos de tesouros embrulhados em papel de seda, feitos de histórias de gente sem nome, feitos de viagens. Há lugares que ajudam a construir outras histórias, possibilitando mais um dinheirinho para ajudar a subsistência, abrilhantando festas em outros lugares do mundo, permitindo levar a Ilha em viagem…
Este é um lugar desses. Fica na Rua das Mercês, 31.
E tem um rosto: Joaquim Pedro Drumond de Sá e Sousa.
Data de nascimento:  16 de agosto de 1937
Profissão: Fabricado de Bordados da Madeira, melhor dizendo:  “Manufactures and Exporters of Madeira hand made Embroideries”.

segunda-feira, 16 de março de 2015

A próxima história...



O protagonista
 
Filho de Pedro Damião de Sousa e de Maria Drumond de Sá, Joaquim Sá e Sousa vive (d)os bordados há 62 anos...

Di-lo, entre gargalhadas, como se o tempo não lhe doesse e a vida continuasse a ser como era: cheia. De trabalho. De viagens. De amigos. De negócios feitos...

- O meu pai tinha uma fábrica de bordados, que ficava na Rua Conde Carvalhal, no Chão da Loba. Apenas ele e um outro irmão (durante algum tempo, apenas) se deixaram enredar nas teias dos pontos e das linhas, dos linhos e dos algodões…
-  Fui colega do Pinto da Costa, o próprio. Tudo o que ele sabe, foi eu que lhe ensinei (risos).

Joaquim Sá e Sousa (foto de Cláudia Faria)

quinta-feira, 12 de março de 2015

É ESTE O LUGAR...


Foto Cláudia Faria
 

 
A casa é um labirinto cheio de memórias. Por entre corredores escuros e trémulos  - porque a idade não perdoa [também aos edifícios], fomos descobrindo tesouros que mãos de artistas foram construindo, no vagar da vida de casa, no vagar da fazenda…

Em caixas de cartão, o trabalho [ainda] espera o seu lugar definitivo… Um dia destes, vamos desvendar o lugar… este lugar

segunda-feira, 9 de março de 2015

onde andarão?




foto Cláudia Faria 


o pó cobria a o armário, as prateleiras ... e a caixa de cartão ... assim que a abrimos ... ecoou naquela torre, abandonada, vozes de outros tempos ... murmúrios de mulheres que, incansavelmente, dia após dias, puxavam a linha ... diligentemente, aperfeiçoando os garanitos, as cavacas, as viúvas e as folhas...
... este tempo [antigo] cansou-se de nós ... por onde andam as bordadeiras?

quinta-feira, 5 de março de 2015

O princípio

Foto de Cláudia Faria
Começa aqui a descoberta de um mundo que acorda memórias antigas, daquelas com cheiro a anil e a brasas preparadas para o ferro de engomar.
Começa aqui. Uma porta aberta. Uma escadaria velha. Uma parede descascada. O silêncio...
Começa aqui a nova história de vida que havemos de contar...

segunda-feira, 2 de março de 2015

À espera do fim

Já foi uma casa de bordados. Já não é.
Na torre de uma casa velha da cidade, com vista para os telhados de uma rua [ainda] movimentada, jazem os restos da vida de muita gente ligada à indústria...
Os sacos, rotos de ratos e de velhice, esperam... o fim, talvez...
Foto de Cláudia Faria

Será este o futuro do Bordado Madeira?