segunda-feira, 25 de março de 2013
quinta-feira, 21 de março de 2013
Nós somos o lugar onde estamos
… e porque quando
saímos para falar com as pessoas, esbarramos em lugares, em ruas, em casas, em
pedaços de vidas que, em silêncio, falam connosco…….
terça-feira, 19 de março de 2013
UM CONTADOR DE HISTÓRIAS....DA VIDA
O Sr. Augusto António é um contador de histórias. Pausadamente, ao ritmo da memória, recua até à Rua de Santa Maria, nos anos 30 e sorri:
- Eu era da zona do Calhau. E era maravilhoso. A minha mãe teve 18 filhos, acho eu, que morreram muitos. Não tínhamos brinquedos, quando encontrávamos algum carrinho de madeira, sem rodas ou partido, deixado por algum menino rico, era um tesouro…
A vida do calhau era praia. Foi à escola. Fez o 2º ano do ciclo, depois, não quis estudar mais…. Foi aprender a arte de “desenhador” numa firma de bordados.
Conta dos livros que sempre o apaixonaram . Conta dos filmes que via com o avô, analfabeto, que o metia dentro de um capote, um pouco à maneira do Cinema Paraíso. Conta como lia em voz alta as legendas…. Conta das viagens. Da primeira, sozinho, no Vera Cruz, para visitar um amigo de Famalicão. Levava uma toalha bordada, fruta e um cacho de bananas para oferecer. Conta do espanto que causava pelo caminho.
- Sou da Madeira.
- Nunca tinha visto ninguém da Madeira.
E perguntavam se tinha muitos macacos, muitos pretos. Nunca tinham visto um cacho de bananas, nem abacates, nem anonas.
- Não percebiam o que eu dizia. A nossa pronúncia era muito carregada. E então no calhau…. Lembro-me que o meu pai me tinha dito que nunca confiasse num continental:
- Havia muitos continentais que vinham para a tropa e enganavam as moças…. Vai sempre com um pé atrás, disse-me ele .
Foi ao contrário. Completamente ao contrário. Foi lá que provou outras coisas que não milho ou caldeira – pastéis de bacalhau, arroz de frango…. Voltou lá muitas vezes de barco; voltou no hidroavião (o pai foi buscá-lo porque ficou doente). Foi em Famalicão que encontrou um amor para a vida, uma mulher mais velha sete anos, com quem viveu 52 anos. Não se esquece o que ela lhe disse: - O menino vai para a escola e depois a gente conversa.
Não foi à escola. Ficou doente de amor. Foi consultado em Lisboa pelo Dr. Egas Moniz, o Nobel. Um orgulho.
- Isso é paixão.
Casou. Vai para o Brasil trabalhar em bordados. Havia umas fabriquetas em S. Paulo…. Tinha um fascínio pela vida do Rio de Janeiro…. Depois, por razões de ordem vária, quando o bordado decaíu, vai para a Austrália. Tem histórias sem fim deste lugar, de trabalhos e de aventuras, de esperanças e de desilusões. Viveu lá mais de 40 anos. Foi funcionário público sem saber escrever inglês. Nunca gostou daquela terra, nem daquela gente:
- Têm um espírito muito curto. São racistas. Naquele tempo, não suportavam o emigrante. São ilhéus mais fechados do que os madeirenses do lugar mais recôndito da ilha….
E conta outras histórias. Com vagar…. Ao ritmo da memória…. Havemos de as contar…. Esteja atento.
A story teller
Augusto António is a story teller. Following the rhythm of his memory, he went back in time, to the 1930s when he used to live in Santa Maria and smiling said to us:
- I used to live down by the beach. I was wonderful. My mother had 18 children, I think. Some have died. We had no toys and sometimes when he found a lost wooden car left on the street we believed it was a treasure… Life in that place was spent at the seashore. He attended school and after the 6th grade he decided to abandon school. He went to learn how to make drawings at an embroidery factory.
He told us that he loved reading. He also told us about his grandfather, a fisherman who could not read nor write but who took him to cinema. He had to hide himself under his raincoat. He remembered reading aloud the subtitles to his grandfather… He told about his voyages. The first, on board Vera Cruz, when he went to see a friend in Famalicão. He took an embroider table cloth, some pieces of fruit, a banana bunch to offer the family and the remembered how people stared at him.
- I am from Madeira, he explained.
- I had never seen anyone from Madeira, people answered back.
And then they asked if there were many monkeys and Negroes. They stared at the bananas, at the avocados, the custard apples. They did not understand what I said. Our pronunciation was very different at that time. My father warned me:
- Son, do no trust those people in the mainland. Probably this was because some of the military men who spent some time in Madeira cheated on the local girls…. Be aware, he told me. Things happened differently. People were kind and he tasted so many different kinds of food.
He went back in the following years and once his father had to fly on the Aquila Airways plane to bring him back. He was sick. He had met the love of his life. A young girl seven years older than him with whom he married and lived for 52 years. He still remembers what she told him when he proposed to her:
- You are too young. You have to carry on your studies and then later we can talk about it.
He did not go back to school. He was in love. Madly in love and got more and more sick. In Lisbon he had an appointed with Dr. Egas Moniz, who told his father:
- The boy is in love. The finally got married. The couple went to Brazil and Augusto started working in the embroidery business. He was employed by some small factories in São Paulo … but he was completed fascinated by the way of living in Rio de Janeiro… Then, he decided to go to Australia. Emigrants were not welcomed. They are islanders too, but narrow minded… worse than Madeirans who live in the interior of the island …
And he kept on telling stories…. Soon we promise to share them with you …
- Eu era da zona do Calhau. E era maravilhoso. A minha mãe teve 18 filhos, acho eu, que morreram muitos. Não tínhamos brinquedos, quando encontrávamos algum carrinho de madeira, sem rodas ou partido, deixado por algum menino rico, era um tesouro…
A vida do calhau era praia. Foi à escola. Fez o 2º ano do ciclo, depois, não quis estudar mais…. Foi aprender a arte de “desenhador” numa firma de bordados.
Conta dos livros que sempre o apaixonaram . Conta dos filmes que via com o avô, analfabeto, que o metia dentro de um capote, um pouco à maneira do Cinema Paraíso. Conta como lia em voz alta as legendas…. Conta das viagens. Da primeira, sozinho, no Vera Cruz, para visitar um amigo de Famalicão. Levava uma toalha bordada, fruta e um cacho de bananas para oferecer. Conta do espanto que causava pelo caminho.
- Sou da Madeira.
- Nunca tinha visto ninguém da Madeira.
E perguntavam se tinha muitos macacos, muitos pretos. Nunca tinham visto um cacho de bananas, nem abacates, nem anonas.
- Não percebiam o que eu dizia. A nossa pronúncia era muito carregada. E então no calhau…. Lembro-me que o meu pai me tinha dito que nunca confiasse num continental:
- Havia muitos continentais que vinham para a tropa e enganavam as moças…. Vai sempre com um pé atrás, disse-me ele .
Foi ao contrário. Completamente ao contrário. Foi lá que provou outras coisas que não milho ou caldeira – pastéis de bacalhau, arroz de frango…. Voltou lá muitas vezes de barco; voltou no hidroavião (o pai foi buscá-lo porque ficou doente). Foi em Famalicão que encontrou um amor para a vida, uma mulher mais velha sete anos, com quem viveu 52 anos. Não se esquece o que ela lhe disse: - O menino vai para a escola e depois a gente conversa.
Não foi à escola. Ficou doente de amor. Foi consultado em Lisboa pelo Dr. Egas Moniz, o Nobel. Um orgulho.
- Isso é paixão.
Casou. Vai para o Brasil trabalhar em bordados. Havia umas fabriquetas em S. Paulo…. Tinha um fascínio pela vida do Rio de Janeiro…. Depois, por razões de ordem vária, quando o bordado decaíu, vai para a Austrália. Tem histórias sem fim deste lugar, de trabalhos e de aventuras, de esperanças e de desilusões. Viveu lá mais de 40 anos. Foi funcionário público sem saber escrever inglês. Nunca gostou daquela terra, nem daquela gente:
- Têm um espírito muito curto. São racistas. Naquele tempo, não suportavam o emigrante. São ilhéus mais fechados do que os madeirenses do lugar mais recôndito da ilha….
E conta outras histórias. Com vagar…. Ao ritmo da memória…. Havemos de as contar…. Esteja atento.
A story teller
Augusto António is a story teller. Following the rhythm of his memory, he went back in time, to the 1930s when he used to live in Santa Maria and smiling said to us:
- I used to live down by the beach. I was wonderful. My mother had 18 children, I think. Some have died. We had no toys and sometimes when he found a lost wooden car left on the street we believed it was a treasure… Life in that place was spent at the seashore. He attended school and after the 6th grade he decided to abandon school. He went to learn how to make drawings at an embroidery factory.
He told us that he loved reading. He also told us about his grandfather, a fisherman who could not read nor write but who took him to cinema. He had to hide himself under his raincoat. He remembered reading aloud the subtitles to his grandfather… He told about his voyages. The first, on board Vera Cruz, when he went to see a friend in Famalicão. He took an embroider table cloth, some pieces of fruit, a banana bunch to offer the family and the remembered how people stared at him.
- I am from Madeira, he explained.
- I had never seen anyone from Madeira, people answered back.
And then they asked if there were many monkeys and Negroes. They stared at the bananas, at the avocados, the custard apples. They did not understand what I said. Our pronunciation was very different at that time. My father warned me:
- Son, do no trust those people in the mainland. Probably this was because some of the military men who spent some time in Madeira cheated on the local girls…. Be aware, he told me. Things happened differently. People were kind and he tasted so many different kinds of food.
He went back in the following years and once his father had to fly on the Aquila Airways plane to bring him back. He was sick. He had met the love of his life. A young girl seven years older than him with whom he married and lived for 52 years. He still remembers what she told him when he proposed to her:
- You are too young. You have to carry on your studies and then later we can talk about it.
He did not go back to school. He was in love. Madly in love and got more and more sick. In Lisbon he had an appointed with Dr. Egas Moniz, who told his father:
- The boy is in love. The finally got married. The couple went to Brazil and Augusto started working in the embroidery business. He was employed by some small factories in São Paulo … but he was completed fascinated by the way of living in Rio de Janeiro… Then, he decided to go to Australia. Emigrants were not welcomed. They are islanders too, but narrow minded… worse than Madeirans who live in the interior of the island …
And he kept on telling stories…. Soon we promise to share them with you …
quarta-feira, 13 de março de 2013
uma carta misteriosa
A vida também se completa com os imprevistos … com os
acontecimentos inesperados que chegam ao nosso colo ….
A nossa história de hoje começa com um passeio em família na
Praia Formosa. Vitor Bettencourt, encontrou-se com uma folha de papel
amarelecido que esvoaçava ao sabor do vento atlântico ...
Sem hesitar, pegou na folha … olhou de relance e vendo de que
se tratava de uma carta datada de 11 de março enviada de Lourenço Marques
(presumimos que do ano de 1944) e resolveu guardá-la. Já se passaram cerca de
10 anos e há dias, a carta ganhou vida ( sim, porque as palavras têm vida
própria!!) e exigiu de Vitor Bettencourt um olhar mais atento:
O primeiro passo foi transcrever a missiva. Em seguida, e
para facilitar a leitura dos menos habituados, Vitor Bettencourt reescreveu a
carta, já sem erros ortográficos e tentando completar o que entre linhas se
esconde. Não satisfeito ainda, passou alguns dias no Arquivo Regional do
Funchal à procura de Sofia … a destinatária da carta …. aquela a quem o marido
escreveu dando conta de que
- estou muite bam pago 800$00 per meis cama e comoda roupa
lavada e gomado e pontiada …
A carta está ( supostamente) incompleta. Faltará
eventualmente alguma folha. Não sabemos quem é a Sofia. Não sabemos quem é o
marido de Sofia. Mas sabemos que Sofia e o marido viveram longe um do outro,
que ele lhe escrevia para matar as saudades e para lhe dar noticias do que
estava fazendo e de como ia a vida em Lourenço Marques…
É assim a vida… interrompida… ziguezagueante …. esvoaçante, mas
feita de gente como nós …
a misterious letter
Life is also
made up of unexpected and special moments … the story of today began with a
family walk at Praia Formosa. Vitor Bettencourt found an old and yellowish
piece of paper flying in the Atlantic breeze…
He picked it
up and gave it a glance. It was a letter dated from March 11th (presumably
from the year 1944) and decided to keep it in a drawer at this home office. It has
passed almost ten years, and some days ago, the letter gained life (yes, words
do have a life of their own!) and demanded Vitor Bettencourt to examine it more
carefully:
The first
step was to transcribe the letter. Then, and in order to facilitate reading,
Vitor Bettencourt re-wrote it, getting rid of the mistakes and trying to
complete the sense, that is, reading between the lines – a demanding but rewarding
task, indeed. Later, and still not pleased with the results, he spent some days
at Funchal Archive looking for Sofia … the person to whom the letter had been
sent … the wife whose husband had written telling that :
-
I am very well paid 800$00 per month
for a bed and cleaned laundry…
The letter is
incomplete. We think that a page might be missing. We don’t know who Sofia is.
We don’t know who her husband is, either. However, we do know that Sofia and her
husband lived apart from each other and that he wrote to her telling about his
life in Lourenço Marques and how he missed her so much…
Sofia’ s
letter is a perfect example of the ways of life … fragmented, twisted …
winding, but made up of people just like you and I.
segunda-feira, 11 de março de 2013
Uma guitarra
Já casado, decide partir para a Venezuela, à procura de
futuro. Tem lá um irmão que o manda chamar. .. Pede, então, dinheiro ao tio
padre, para a viagem. Tinha de passar em Lisboa por causa do visto. Mas o visto
demorou. Demasiado tempo.
E o dinheiro para se manter em Lisboa – por mais humilde que
fosse a pensão – acabou. Era preciso mais uma remessa. Escreveu, então, uma
carta que chegou ao destinatário uma semana depois. Demasiado tarde.
Não havia outra solução, senão vender um dos dois valores
que levava: a aliança do casamento ou a guitarra. Vendeu a..... aliança.
Ele morreu, mas a
guitarra permanece. Sentada . Ainda guarda a mesma corda que lhe abraçou
as noites duras dos primeiros tempos em Venezuela:
- o meu pai tirava areia de um rio e dormia sobre sacas, mas
nunca deixou de cantar o fado.
A vida mudou. Como outros emigrantes, João construiu a vida.
Levou consigo a familia. Conheceram treze casas. Porque à procura do lugar
melhor. Sempre de passagem.
O seu lugar era aqui. E voltou. Para ficar. Logo que pôde,
comprou outra aliança. Mas foi fiel à
guitarra. E ao fado. E à família. E ao
seu lugar.
A guitar
Our tale of
today tells about Fado. Joao´s daughter remembers her father so well – a gardener,
who during the 40s, went away chasing his dreams.
He was
already married when he decided to leave Madeira. He wanted to go to Venezuela
because he had already a brother there. He asked for a loan to one of his
uncles, who was a priest. João had to stop for some days in Lisbon waiting for
the visa.
The days
passed and he spent all the money. He wrote a letter back home asking for more
money but it took too long to get to Madeira.
He had no
other choice. He needed money desperately and the solution was either to sell
the wedding ring or the guitar. He decided to sell ….. the wedding ring.
João is
already dead. His daughter still keeps his guitar … the one that helped him
endure the long and harsh nights in Venezuela:
-
My
father used to work in the river…. he collected sand…. and he used to sleep on
the top of the sand sacks … and he never stopped singing Fado.
Life has
changed. Like most of Madeira emigrants, João struggled hard to build his own
life. He sent for this family after a while. They were always on the move: they
have lived in 13 different houses… always rolling.
But he
belonged here and so he came back. As soon as possible, he bought another wedding
ring. He never ever sold his guitar, though. Nor will his daughter!!
sexta-feira, 8 de março de 2013
À procura de artistas
29 de Maio
de 1962, Teatro Baltazar Dias, Funchal
Helena Paula e Carlos Alberto, locutores das produções HC,
apresentaram a grande final do concurso À Procura de Artistas. Do programa
da noite, constaram 12 concorrentes que interpretaram, na maioria, temas
originais.
No dia
seguinte, a imprensa regional anuncia os grandes vencedores:
Vozes masculinas
1º Classificado-
Fernando Madeira, eleito igualmente príncipe da Rádio
2º Classificado-
Carlos Gama
3º Classificado-
Artur Campos
4º
Classificado- Carlos Teixeira
Lígia
Fernandes, eleita Princesa da
Rádio
Onde andam
estas vozes? Porque impera o silêncio e o esquecimento? Ficamos à espera de notícias
vossas, temos a certeza de que algures, alguém nunca se esqueceu destes
artistas madeirenses!
29th May
1962, Teatro Baltazar Dias, Funchal
Helena Paula and Carlos Alberto, from HC productions,
presented the grand final of the contest Looking for Artists. The evening was
animated by 12 competitors who sang, most of them, original songs.
In the following day, the local press proudly
announced the winners:
1st classified – Fernando Madeira, who was
also elected Radio Prince
2nd classified – Carlos Gama
3rd classified - Artur Campos
4th classified - Carlos Teixeira
Female voice
Lígia Fernandes, elected the Radio Princess.
Why don’t we hear these voices anymore? Where are
they? Why are they silent and why have we lost memory of these artists? We are
sure somewhere out there somebody does remember them. Please, come and share with
us what time cannot erase!
quinta-feira, 7 de março de 2013
ARAÚJO, Lídio, 2003, Os Bravos da Picada, O Liberal, Madeira.
Um diário de guerra. Ou quase. Porque a escrita do eu –
jovem furriel madeirense – se esconde atrás de uma terceira pessoa:
“24/11/73: (...) Poderia ter fugido para lá dos Pirinéus, como muitos
rapazes da sua idade, e trabalhar nas obras em França, no Luxemburgo ou na
Alemanha. Mas para quê? Este era o seu país. (...) Ali era o lugar onde
desejava constituir família e viver sem problemas de consciência po ser
considerado refractário. Partiria, com fé e muita esperança de regressar são e
salvo.” (p.11)
Ao longo de 127 páginas,o leitor acompanha a vida da 2ª
Companhia do Batalhão Expedicionário 5014, entre novembro de 1973 e dezembro de
1974, entre Viana do Castelo e Moçambique, entre o Zóbué e Lisboa [com a Madeira à vista]. São
memórias de coragens e de angústias, lembranças de aerogramas e silêncios.
Deixamos-lhe alguns excertos:
“25/11/73: Sem possibilidade para receber os últimos conselhos
dos familiares mais queridos, guardar um abraço amigo, provar o beijo amargo da
partida (...) os furriéis Araújo e Medeiros, ambos ilhéus, da Madeira e dos
Açores, encontraram acolhimento, vão consolo de despedida, no gesto de
solidariedade de uma desconhecida figura feminina(...). (p. 12)
“26/11/73: Pediu uma Coca-Cola. Era o seu primeiro contacto
com aquela bebida americana. (...) E as Províncias Africanas não pertenciam à
mesma nação? Coisas da governação salazarista” (p. 14)
26/11/73 : “é urgente vencer o primeiro inimigo, o medo”
(p.15)
29/11/73 – 1ª CARTA: “os que já estão contaram-me coisas que
não sei se devo ou não acreditar, mas tudo se ha-de compor...Adeus até ao meu
regresso” (p.18)
4/12/73: “ Rezou à Virgem de Fátima, pediu-lhe protecção
para si e para os seus companheiros e prometeu-lhe ir visitá-la no Santuário se
conseguir regressar ao convívio dos seus familiares são e salvo” (p.22)
25/12/73 [militares]:
“escravos da incongruência bélica de uma alcateia de lobos atacada por semil
demência” (p. 27)
3/3/74:“Recebemos o pré. A nível dos furrieis, 4.300$00, ca
e na Metrópole ficaram 11.700$00 (...) Quase todso os militares optaram por
deixar 2/3 do pré na Metrópole, à guarda da família. (p.54)
1/4/74: “A grande maioria dos mainatos é composat por
crianças os cinco aos doze anos, subnutroidos, esfarrapados e sem escolaridade
que vagueiam pelo quartel, voluntários,sempre prontos a executar qualquer
trabalho. Nada mais querem senão comida e protecção.
Uma vez por semana, levam a roupa para ser lavada no rio e
trazem-na fresca e passada a ferro, quase sempre pelas suas próprias mãos,
recebendo em troca 50$00 mensais. (p. 65)
Epílogo:
“fomos actores e espectadores de um drama que (...) deixou marcas
profundas” (p. 109)
“partimos contrariados. (…) Regressámos de cabeça
erguida” (p. 109)
ESPERAMOS AGORA PELO SEU RELATO. Contacte-nos.
A war journal.
Or a war notebook. It does not really matter the text type because what is
important is that this is the story of a young soldier who created a persona to
tell about wartime in the former Portuguese Overseas colonies:
24/11/73: (…)
I could have tried to escape at the Pyrenees, like some did, and go to work in
the construction field in France, Luxemburg or even Germany. But what for? This
was my homeland (…) this is where I belonged and where I was sure to build my
family in the future. Besides would I be able to live with the idea of being a
deserter? So, I went to war and with hope and faith I was sure I was going to
come back home safe and sound. (p.11)
In a 127 page
book the reader gets to know the everyday life of the 2nd Expedition
Company 5014 between November 1897 and December 1974. The story location is centered
in Viana do Castelo, Mozambique, Zóbué and Lisbon [with Madeira Island always
in sight, though]. These are pages full of courage, anguish, memories and many
silences:
25/11/73:
With no chance of listening to the advice of family and friends, to give a hug
and kissed them goodbye (…) soldiers Araújo and Medeiros, from Madeira and from
Azores found themselves welcomed and somehow comforted by an unknown feminine
figure …. (p. 12)
26/11/73: He
ordered a coke. It was the first time he was going to taste the American drink.
(…) Were the Oversea colonies a part of the Portuguese nation? He wondered.
Salazar policies he answered. (p.14)
26/11/76: The
most important thing is to conquer the worst enemy: our fear. (p. 15)
19/11/73: 1st
Letter: the ones who have arrived here first have told me stories I am not sure
whether to believe or not, but I am sure everything will turn out right….
Goodbye and see you soon. (p. 18)
4/12/73: He
prayed to Our Lady of Fatima and asked for her protection and made a promise to
visit the Sanctuary if he ever came back safe and sound. (p.12)
25/12/73 [military]:
we were the slaves of an absurd war; a pack of wolves suffering of insanity. (p.27)
3/3/74: We
received the salary. The Senior Officers were paid 4.300$00 but here and in the
mainland the amount of 11.700$00 was left. (…) Almost all the military chose to
leave 2/3 of the salary in the mainland to be sent to their families. (p.54)
1/4/74: most
of the servants were young boys, 5 to 12 year old boys, starving, ragged and illiterate
who voluntarily were always ready to do any job. They only asked in return some
food and protection. Once a week they did the laundry and brought the clothes
back already ironed and were paid 50$00 for this service. (p.65)
Epilogue
We have been
actors and spectators of a life drama (…) which has caused so many traumas. (p.
109)
Most of us
left against our will (…) but we came back proud of ourselves. (p. 109)
This was officer
Araújo’s tale. What about yours? Come and share it with us!!!!
terça-feira, 5 de março de 2013
O Bomboteiro[ nas palavras de Carlos Fino]
o bomboteiro vem a bordo
traz a ilha nos dedos
só não sabe bem que memória varou o casco
e porque sobe agora as ladeiras com espuma nos olhos
só o outono invoca os dias longos dos paquetes
já não regressa
ginga os passos ao sabor das nuvens e sonha
o bomboteiro
segunda-feira, 4 de março de 2013
UM BOMBOTEIRO - LUIS DA MOTA
Luis da Mota é (ainda) bomboteiro,
filho de bomboteiro:
Luis da Mota: a bumboat’s salesman
- o meu pai morreu a bordo do vapor do Cabo. Foi o
coração. Estava a fazer negócio e deu-lhe um ataque, Eu e o meu irmão fomos
tirar a licença.
Tem 83 anos, usa uma barreta
preta, como nos outros tempos, vive na Rua de Santa Maria e continua a amar o
mar, que lhe traz (ainda também) o pão de cada dia. Ele e mais uns ainda tentam vender os seus produtos na Pontinha, apesar
de continuar a dizer
- quando há navio, vamos ao mar.
Traz uma ampliação de um retrato
antigo de canoas e bombote
- os marítimos,
e vai narrando a arte , apontando
para a imagem, como se voltasse atrás, a um tempo de durezas e alegrias, de
negócios e de ingleses. Conta das canoas, das licenças, dos vimes que iam
comprar à Camacha, das bonecas, dos barris, dos bordados
- que as nossas mulheres bordavam,
no intervalo das vidas.
Fala da forma como faziam subir a
mercadoria, entre a canoa e o vapor, quando não era um vapor do Cabo, porque a
esses podiam ir a bordo. Fala das vezes em que a mercadoria era recebida e
- não arriavam o dinheiro.
Fala pouco e precisa das
fotografias para apoiar o seu discurso:
- A mergulhança era isto: os pequenos saltavam das
canoas. Eram 8 ou 9 canoas da
mergulhança. Isto era daquele tempo do Venena.
Era dinheiro que entrava no país, de graça. O dinheiro era para os 3 do
barco O cabo do mar deu cabo dessa mergulhança. Era reles, esse cabo do mar. Era
o Alemão. Alguns ainda estão vivos. Ainda conheço alguns. Andam na zona velha.
Param ali. Há um que trabalha com a gente, o Jana.
Fica depois calado, quando lhe
perguntamos de outras coisas, como era a vida, se havia outros negócios,
embrulhados nas toalhas que vinham de volta.
Que a vida era melhor, naquele
tempo:
- às vezes, fazia-se mais de cinco contos e cinco contos dava para as compras , para pagar a
casa. Agora não dá para nada.
Como não tem mar para olhar, olha
para os retratos que nos trouxe. Diz que serviram de reclame na Expo. E isso
foi bom. Já ninguém se lembra deles….
Luis da Mota: a bumboat’s salesman
Luis da
Mota was ( and still is) a bumboat’s salesman like his father was:
-
My father died on board a vessel. He
had a heart attack. He was doing business and had a stroke, so me and my
brother we decided to take a license.
He is 83
years old. He wears a black hat and he still lives in Rua de Santa Maria. He
loves the sea and most of all he is thankful for having been able to make a
life out of it. He, and some other guys sell their products at Pontinha
whenever a vessel anchors at Funchal and although they have a small shop at the
harbour they still say:
-
When a vessel comes in, we go to
sea.
He brought
along a painting of old bumboats and men selling their products
-
All men of sea,
And he
pointed to the picture and going back on time he told about good and bad moments, of business, of
the English. He remembered the boats, the licenses, the wickerwork bought in
Camacha, the dolls, the wine barrels, the embroidery,
-
Our wives stayed at home and made
embroidery,
in their spare time.
He explained how the merchandize was lifted up on board. They were only
allowed to go on board in the vessels that were destined to Cape Town. And he
recalled the occasions when they kept the goods
-
And did not pay back.
He did not
talk much and he needed the photos to organize his speech:
-
Young boys jumped from the little
canoes into the water. Normally there were 8 to 9 canoes. One of them was
called Venena. This was a way of earning money, for free. The money was divided
between the men. The sea captain put an end to this activity. He was very
strict. His nickname was “the German”. Some of these boys are still alive. I
still know some of them. They come frequently to the old part of the town. They
hang out there. One of them, works with us, his name is Jana.
Then he
stopped. We asked him about living conditions and if there were other types of
business … if smuggling was frequent…
And he
answered that life was better back then:
-
Sometimes, we earned around 5 contos
and the money was enough to pay the rent and go to the supermarket. Nowadays is
not enough.
He focused on the photos he had brought to show us. They were used as a
promotion during the Expo. It was a good thing to do. Now, nobody remembers
these men any more…..
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