quinta-feira, 4 de julho de 2013

Madrinha de guerra

Episódio 1: a intenção
 


 

M. G. tinha 26 anos e era enfermeira no Hospital da Misericórdia. Estava a começar o trabalho que havia de levar para a vida, uma missão que ela sabia importante, num tempo de guerras e de vidas muitas vezes desfeitas, logo na juventude.

No Ultramar, havia rapazes  a cumprir o serviço militar, rapazes da sua rua, miúdos que vira crescer, na alegria dos caminhos. Aqui, na ilha, percebia a angústia das mães, das namoradas, e a importância que as palavras tinham na vida dos dois lados da pátria.

Descobriu, então, que havia revistas que traziam pedidos de militares que queriam corresponder-se com madrinhas de guerra. Da lista, escolheu um nome, quase ao acaso. Na verdade, não havia nenhuma informação relativa aos rapazes, para além do nome e das moradas Respondeu. Ofereceu-se. Ele disse que sim.  

M. G. trouxe ao nosso projeto a sua historia da guerra. A memória da primeira carta: dizia-lhe que vivia à distância o medo que ele sentia, a solidão e o isolamento, a falta da familia, a falta dos afetos da familia,  as incertezas da guerra.

Lembra-se desse dia. Tão bem. Fazia o turno da noite. Era um momento de calma no hospital. O Funchal espreguiçava-se lá em baixo....

- Caro militar..... caro afilhado..... caro amigo.....

Se se lembra do nome? Perfeitamente. Era o Guerrinha.

- O Guerrinha na guerra .... (ri)

Nesse tempo, não tinha muita noção do que era aquilo. Sentia que devia ser uma coisa de muito sofrimento, mas não tinha muito bem estruturado dentro de si o que significaria era obrigação de ir para a África; era politíca e a politica não lhe dizia praticamentenada. Não falavam nisso entre as raparigas. Só quem tinha familiares no ultramar é que se interrogava, ou não. Os rapazes tinham de ir. Pronto.

- Participei nisto de ser madrinha de guerra  por ser meio solidária, meio maluca, meio atrevida.

Ele estava em Moçambique. Ela aqui. Ele não era madeirense. Ela sim. Portanto, o que tinha a fazer era ouvir os seus desabafos, dar-lhe  apoio, força, esperança num regresso onde ele ia encontrar um rio, um oasis de “pão e mel”, de felicidade. Falava-lhe do que tinha cá, dos seus entes queridos que o esperavam, dizia-lhe  que vivesse bem, para ser depois consolado com todos os afetos da familia e dos amigos.

[continua]

 

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