[LEMBRANÇAS DA GUERRA]
Era um menino ainda. Teria uns sete ou oito anos, não mais... a guerra fazia-se lá fora, mas a ilha conhecia bem o seu preço. Os marítimos – homens que faziam do mar a sua vida – também, pois os barcos já não vinham, porque – dizia-se – as águas estavam infestadas de submarinos .
Desse tempo duro, de falta de tudo, o nosso amigo Augusto
guarda a lembrança de uns fardos que
davam à costa no Almirante Reis: eram destroços de bóias ou de navios que
encantavam os miúdos que faziam do calhau o seu quintal.
- Lembro-me tão bem...
O Sr. Augusto reconstrói a história que vai contar; escolhe
as palavras, procura na memória as cores, as sensações, os pormenores:
- Eu já andava, há muito tempo, atrás do meu avô para que me levasse, à
noite, na canoa. Os pescadores contavam que, à nooite, no Toco, às vezes,
apareciam umas luzes na encosta, que eram feiticeiras. Eu tinha muito medo, mas ficava encantado com
as coisas que os homens do mar inventavam... Uma noite, o avô levou-me.
Nos seus olhos, o tempo.
O menino ainda não se dava bem com os balanços da canoa. E
ficava olhando o mar e a noite e
- Avô, uma baleia!
Havia uma “coisa” negra a emergir. Enorme.
Foi então que o avô,
«Shiu! Não faças barulho. Não é uma baleia. É um submarino
alemão. Não tenhas medo. Eles não nos fazem nada. Se sair alguém é para pedir
peixe....Em troca, dão qualquer coisa deles....»
Esperámos. Não saíu ninguem... Voltámos para casa em
silêncio. E eu não cheguei a ver as feiticeiras que iluminavam a noite....
Tales from
the seashore – part II
[war
memories]
I was still a kid. Maybe seven or eight years old …
not more than that… and there was a war somewhere out there, almost unknown in
Madeira. The sea men – those who were depended on the sea – noticed immediately
because vessels did not stopped at Funchal – because the waters were full of
submarines.
Our friend António Augusto remembered that once in a
while the beach at Almirante Reis there could be found pieces of ships, strange
objects that obviously marveled the kids.
- -
I remembered it so well…
He tried to build the story in order to tell us, he
chose the words, and made an effort to select the perfect colours, the
sensations so as not to forget all the details:
-
I had insisted with my grandfather to
take me with me in the canoe, during the night. I had heard fishermen telling
that sometimes, at Toco (beach) lights could be seen and they said it were
witches. I was scared! Really scared but at the same time, anxious to go with
them… and one day my grandpa took me with him.
Time stood still in his eyes.
António Augusto
was not used to the rhythm of the sea and felt sea sick. He tried to focus his
eyes on the darkness of the sea and of the night.
-
Grandpa, look! A whale!
There was something coming up indeed! Dark! Huge!
And immediately, his grandfather told him,
-
Shiu! Don’t make any noise. Stand
still! It is not a whale. It is a German submarine. Don’t be afraid. They won’t
hurt us. If someone comes out I will give them fish … in exchange, they will
give me something else…
We waited for a few moments. Nobody came out. We
returned home quietly. I was a bit disappointed, though. I had not seen the
witches, after all!
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