Já tinha eu dezasseis anos, pedi à
minha mãe para me fazer sócia do clube da minha simpatia, o que mereceu a sua
concordância. Quando me fui inscrever, convidaram-me para a festa da
inauguração da sede. Aproveitando o forno de uma vizinha que amassara pão, fiz
um bolo de laranja para levar e prontifiquei-me a colaborar nos serviços, como
o fizeram outras simpatizantes. Sendo habituada a servir na casa de chá das
festas da Vila e do Rosário, tinha alguma experiência do assunto e tudo decorreu
com normalidade.
Em meados de Setembro, estava a
ser preparado com entusiasmo um grande torneio a fim de ser encontrado o
campeão da época. Para maior animação fora convidado o grupo da Ribeira Brava
que costumava levar uma enorme claque. A animação aumentava por toda a
freguesia, onde rapazes e raparigas preparavam faixas, bandeiras, chocalhos e
pandeiretas para terminar em festa e em beleza. O que ninguém estaria à espera
e causou grande surpresa e descontentamento a muitos jovens foi o agendamento
de uma novena no Pico da Cova, no mesmo dia do torneio. A Capela Torre ali
erigida, dedicada a Nossa Senhora de Fátima foi construída para agradecer o fim
da Segunda Guerra Mundial e inaugurada poucos anos antes. Muitos eram os
emigrantes que mandavam celebrar novenas em honra de Nossa Senhora naquele
local implorando a Sua ajuda e pedindo protecção, algumas com pompa e
circunstância, caso desse dia.
Eu, conhecia o sentimento da
minha mãe e sabia que a sua decisão seria - primeiro a novena,- embora ela, por
motivos de saúde não se deslocasse à capela que ficava a cerca de uma hora de
caminho a pé. Conformada, e porque tinha ainda na memória o acontecido umas
semanas antes, embora contrariada, aceitei o veredicto.
Com muita mágoa naquele dia, em
vez de descer para o Calhau, tive de subir até ao Pico. Durante a celebração
ouvia os foguetes lá ao fundo e ficava em sobressalto. Sabendo que o Arsenal
naqueles encontros costumava claudicar, só podia ser o Corvo a fazer a festa, o
meu cérebro rodopiava e ainda hoje me sentencio pela pouca atenção prestada.
Terminada a cerimónia, descemos o
pico numa correria e mal chegamos ao Laranjal já um grupo de jovens chegava em
algazarra, animados com apitos e bandeiras do Arsenal. Eu nem queria acreditar…
O Meu clube do coração tinha ganho ao Corvo por dois a zero, em terceiro lugar
ficara o Botafogo.
Nessa mesma tarde havia um
espectáculo no Teatro Gil Vicente nas Feiteiras, onde iriam atribuir uma outra
taça- Simpatia- com os bilhetes da entrada a servirem de voto. Eufórica,
imaginei nova aventura e logo enviei a minha irmã para casa com umas vizinhas
pedindo que levassem o recado à minha mãe. Fiquei com outra amiga e a passo
largo subimos a vereda da Corrida das Feiteiras que ia sair junto ao dito
Teatro. Num ápice lá estávamos. A alegria do reencontro com simpatizantes em
delírio foi tão emocionante que nos abraçámos e chorámos. O bilhete custava um
escudo, a Leonor comprou os dois para eu pagar quando pudesse. Junto à porta
encontravam-se três caixas grandes, cada qual com o emblema do Clube em que
devíamos votar, na caixa do Arsenal colocamos o couto do bilhete e entramos
cedo para conseguir um bom lugar. Subimos para o balcão ainda com muitos
lugares à escolha, mas dispensamos, porque só de pé é que nos apetecia estar.
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